Postado em 13 de Junho de 2016 às 16h24

Solange Maria Alves

Voz do Autor (36)

Obra aborda o contexto da proposta e do programa Classes de Aceleração, o movimento vivido pelos professores e professoras, o empenho numa leitura histórico-cultural coerente dos sujeitos (aluno e professores), entre outros.

Veja, a seguir, uma entrevista com a autora acerca da obra.

Fale-nos um pouco do livro “Aceleração da Aprendizagem. De quem?”
O livro em questão é fruto do trabalho de pesquisa realizado para fins de obtenção do título de Mestre em Educação pela UNICAMP/UNCENTRO, sob a orientação do professor Angel Pino Sirgado. O problema orientador do estudo emerge da atuação em nível de assessoria, com professores e professoras da rede municipal de ensino de Chapecó (SC), quando da implementação do Programa de Classes de Aceleração neste município. Naquele momento, marcado por um movimento próprio de conflitos, debates, resistências e contradições, colocava-se, através das representações docentes, a indagação acerca dos critérios de seleção das crianças que frequentariam o Programa Classes de Aceleração e sobre quem eram essas crianças. Daí a necessidade de investigar de modo mais profundo sobre esses sujeitos que culminou com a pesquisa e, agora, com o livro. Assim, o livro retrata um pouco este movimento, no interior de uma proposta educacional pautada por princípios político-pedagógicos em favor da transformação social. Procura, após entrevistas com crianças e visita às famílias, levantar elementos concretos para uma leitura dessas crianças como sujeitos históricos, tendo como alicerce mestre a teoria histórico-cultural. O conteúdo do livro aborda o contexto da proposta e do programa Classes de Aceleração, o movimento vivido pelos professores e professoras, o empenho numa leitura histórico-cultural coerente dos sujeitos (aluno e professores). O título aponta para duas indagações que permearam o processo de pesquisa: quem são as crianças do programa de aceleração da aprendizagem, observando aí elementos do cotidiano, da cultura, das relações sociais experimentadas, vividas e internalizadas, constitutivas desses sujeitos, e o fato de que o processo de estudos, debates, reflexões sobre a práxis e as contradições do momento em que se realiza a pesquisa, ter permitido verificar uma mudança no comportamento pedagógico dos/as docentes que viram-se “acelerados” tanto quanto os/as alunos/as. Daí Aceleração da Aprendizagem. De quem?

Quais as características do sistema por ciclos?
Os ciclos de formação, enquanto uma proposta de organização do processo de ensino e de aprendizagem, não se enquadram numa forma única. Por isso, compreendê-los implica, antes, compreender sob que perspectiva político-pedagógica se explicam. No caso da rede municipal de ensino de Chapecó, os ciclos de formação constituem uma forma de organização pedagógica do espaço escolar que visa: superar os limites e contradições do sistema seriado, compreender que o processo de construção do conhecimento não se constitui em ato mecânico, mas se efetiva a partir de trocas sociais, de mediações cujo tempo não se limita a um ano mas a um processo de construção permanente.

Quais os objetivos desse programa?
- Superar os limites e contradições do sistema seriado;
- Compreender que o processo de construção do conhecimento não se constitui em ato mecânico, mas se efetiva a partir de trocas sociais, de mediações cujo tempo não se limita a um ano mas a um processo de constituição permanente;
- Do programa de classes de aceleração: caracteriza-se, a princípio, pela necessidade de superação da defasagem idade/série de alunos/as das séries iniciais do ensino fundamental. No caso da proposta educacional do município de Chapecó, além da defasagem idade/série, o programa procurou fomentar novas perspectivas para o processo de ensino e de aprendizagem. Hoje, o programa Classes de Aceleração já não existe na rede de ensino em questão. Foi substituído pelo que se chama de Progressão para atender situações específicas da passagem de um ciclo de formação para outro.

Houveram críticas sobre sua implementação? Por parte de quem?
Como toda proposta educacional, a implementação dos ciclos de formação na rede municipal de Chapecó enfrentou e enfrenta resistências de diferentes ordens. No campo teórico, por pautar-se na abordagem freiriana de educação, a proposta enfrenta críticas de ordem epidemiológica cujos argumentos revelam um interpretação equivocada da obra de Freire acusada de não diretividade do processo de ensino e de aprendizagem e de omitir a base científica do conhecimento historicamente acumulado, o que não procede mediante uma análise cuidadosa da obra de Freire que insiste incansavelmente em três características fundamentais do conhecimento escolar: sua epistemologia, sua função social, sua dimensão política. No campo político-partidário por ter origem numa administração popular. No campo prático pelas dificuldades históricas do processo de formação docente que estão sendo superadas graças a uma política de formação em serviço bancada pela coordenação da proposta.

Já existem resultados positivos onde o sistema foi adotado? Quais são?
Vale ressaltar que a proposta em desenvolvimento na rede municipal tem sido motivo de pesquisas inúmeras em educação, de visitas externas que buscam subsídios para implementação em seus espaços e tem se destacado em nível nacional em inúmeros eventos de relatos e de assessorias a outras redes de ensino. Algumas pesquisas tem demonstrado avanços significativos em duas direções: no movimento dos/as docentes observa-se um crescimento significativo em termos de compreensão e compromisso com a proposta. No âmbito da construção do conhecimento com as crianças, jovens e adultos, pautado por princípios como autonomia intelectual, consciência histórica, senso crítico, cidadania ativa e outros, pesquisas vêm demonstrando como os sujeitos (alunos) desse processo estão desenvolvendo atitudes concretas a partir da elaboração – reelaboração conceitual orientada pela proposta. Quanto ao Programa de Classes de Aceleração, orientado pelos princípios da proposta é possível dizer que cumpriu uma função importante na concepção da rede no sentido de fomentar um novo olhar sobre as competências para a aprendizagem de crianças multirrepetentes por um lado e, por outro, sobre as demais, em situação regular de ensino. Nasceu com data marcada para morrer, uma vez que se entendia ser um projeto com função específica. Hoje está superado pelo modelo de Progressão – proposta que viabiliza e atende de forma mais qualitativa e específica as necessidades de aprendizagem de alunos/as em situação de dificuldade frente ao processo construído e que, na organização do ciclo de formação, ainda não alcançou níveis desejáveis para o exercício de sua autonomia, cidadania ativa etc. Quanto a Progressão, no entanto, não existem pesquisas que permitam uma análise aprofundada do processo. Este espaço sugere aprofundamento através de investigação científica deste processo.

Quais são suas propostas para “Aceleração da Aprendizagem. De quem?”
Enquanto programa de recuperação da defasagem idade/série, para além das metas econômicas das políticas educacionais, ela só tem sentido se encarada como um projeto cuja tarefa é fomentar novos olhares sobre o processo de construção do conhecimento escolar e promover a ruptura necessária com visões mecanicistas da aprendizagem tão presentes ainda nas relações pedagógicas, materializadas, aliás, no fracasso escolar de crianças, especialmente as das camadas pobres da população, que são hoje crianças do programa de classes de aceleração.

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